sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Morre o cantor Alvinho

"Amigos,



com muita tristeza comunico o falecimento do nosso querido Alvinho, cantor do Conjunto Regional Carinhoso. Escrevi o texto que segue, como última homenagem a este grande guerreiro. Em anexo, uma foto tirada no sesc de Grussaí.
Abraços a todos.
Fiquem com Deus!


Oh, tristeza, me desculpe...

O dia amanheceu espetacular. Do terraço, o cenário bordado de luz lembrava uma enorme tela pintada com maestria pelo nosso Artista Maior. Mas havia um canto triste em meio à algazarra dos passarinhos. Na luminosa manhã desta sexta-feira de primavera partiu nosso querido Alvinho, o canto mais belo de nossa planície, um canto de dar inveja ao mais “afinado” dos passarinhos.


Lembro-me da última vez que estivemos juntos, em apresentação do Conjunto Regional Carinhoso, no Sesc Mineiro de Grussaí. Com a saúde já debilitada devido a um grave problema renal, ele não hesitou em enfrentar os degraus (muitos!) até chegar ao local da apresentação. Amparado pelos amigos e com um bom humor que só os fortes possuem numa hora dessas, chegou ofegante ao salão, mas chegou, impulsionado pelo amor que sempre teve pela música.


Naquela noite, passei preciosos minutos ao seu lado. Os últimos preciosos minutos. Alvinho era de uma sabedoria ímpar. Sabia do que estava falando. E como sabia! Falamos sobre música e músicos, cultura brasileira, mitologia grega, comportamento e outros temas, tudo isso antes que o conjunto entrasse em cena. Um grande mestre é o que ele era. Em pouco tempo tive uma aula de história e fiquei sabendo tudo sobre a cidade de palha, ou o bairro Custodópolis, no qual sempre falava.


No palco, Alvinho cantou lindamente e arriscou os famosos passinhos de samba (mesmo sob o olhar preocupado dos familiares). Foi uma de suas últimas apresentações. “Se eu morrer no palco, morro feliz”, disse antes de nos brindar com Viagem, de Paulo César Pinheiro, de quem era grande fã. “Oh, tristeza me desculpe, Estou de malas prontas. Hoje a poesia veio ao meu encontro, já raiou o dia, vamos viajar...”


Viajaste cedo, amigo, na garupa leve da poesia. Rogo a Nosso Senhor Jesus Cristo que lhe permita visitar as estrelas, sentar-se nas nuvens claras, colher avencas ,lírios, rosas, dálias, pelos campos verdes de jardins do céu, como diz a canção. Faz um favor: quando encontrar lá, pelos tais jardins, os outros carinhosos que embarcaram antes nesta grande viagem, manda pra nós um choro bem bonito pra amenizar o choro dos que aqui ficaram, os que agora têm somente saudade no repertório. Por enquanto vamos entoando uma canção triste como noite sem lua. Como luminosas manhãs sem a doce algazarra dos passarinhos. Vá em paz, amigo! "




Patrícia Bueno
Jornalista

Atualização:
O  enterro será às 16h, no Campo da Paz,  onde o corpo está sendo velado. Na ocasião, haverá uma homenagem do Clube do Choro ao companheiro Alvinho

9 comentários:

Merimeri disse...

Lindo o texto de Patrícia. Impossível não chorar ao lê-lo. Realmente, Alvinho respirava música e poesia. O Céu, lugar tão privilegiado, contará daqui pra frente com o seresteiro ímpar alegrando seus melhores momentos de perfeição. Parabéns, Patrícia, uma vez mais.

Fátima Nascimento disse...

Linda homenagem de Patrícia Bueno e deste blog ao músico.

Patrícia Bueno disse...

Janjan, informa aí que o enterro será às 16h, no Campo da Paz, tá? Obrigada, amiga! Na ocasião, haverá uma homenagem do Clube do Choro ao companheiro. bjs.

Splanchnizomai abraçando o amanhã. disse...

Que coisa linda...Essa canção era minha preferida nos anos 70... nas serenatas... Havia me esquecido desta canção. E quando pensei em dizer aqui, vi ali o "Jesus Cristo", e pensei: Não vou escrever pois vão pensar que vi Jesus Cristo e vim comentar. Até poderia ser. Mas não foi. Foi por causa da música, num momento tão peculiar. Linda postagem.
Se não quiser nem precisa postar. Só vim dizer.

Que o Espírito Santo Consolador console familiares e amigos. Jesus é perito em Consolação.
Na ternura de Cristo,
Rosângela

Patrícia Bueno disse...

Caros comentaristas, agradeço, de coração, pois foi com ele (o coração) que escrevi o texto. Abraço fraterno.

Blog da Odisséia disse...

Patricia,
Linda a homenagem,me emocionei profundamente,pois era um grande amigo. Em seus ultimos momentos de vida dizia que queria se libertar e voar!!!
Beijos
Odisseia Carvalho

Patrícia Bueno disse...

... E voou como um passarinho, pena que nos deixou sem seu lindo canto... Obrigada, Odisséia. Beijos pra você também.

Ulisses Neto disse...

Desde as 3h da madrugada desta sexta-feira, quando fui surpreendido por uma ligação da minha mãe para Salvador, local onde vivo,informando a morte da minha referência de vida (meu avô),tenho me emocionado incontáveis vezes. A tristeza impera e as lembranças me confortam, capilarizando pelo meu corpo toda a bençao de ter sido seu neto.
Tinhamos muitas afinidades, nos adoravamos de verdade, como se nada pudesse ser maior do que a nossa amizade. Quando criança, a minha alegria era ver o meu avô se apresentando no palco ou em qualquer lugar em que sua voz se manifestasse em tom de música e a minha música predileta interpretada por ele, pedia assim: "Voinho, canta Gosto de framboesa", não sabia que se chama "Canteiros".

"Quando penso em vc, fecho os olhos de saudade, tenho tido muitas coisas, menos a felicidade. Pode ser até o amanhã sendo claro feito o dia, mas nada do que me dizem me faz sentir alegria, mas eu só queria ter do mato o GOSTO DE FRAMBOESA,pra correr entre os CANTEIROS e esconder minha tristeza" Era mais ou menos assim.

Após ler o texto da Patrícia, fiquei embriagado de admiração e orgulho do meu voinho e pude dizer isto tudo a ele na cama do hospital, em que ouvia emocionado palavra por palavra o significado da sua presença na minha vida, deixando a tristeza por morar longe e não ter comparecido a sua cerimônia parcialmente de lado.

As lembranças estão vivas e eternizadas na minha memória, através dos momentos em Campos, minha cidade Natal, em Guaxindiba ou em Salvador, onde vivo e sou casado.
Tenho certeza de que o meu pai será para o seu futuro neto o que meu voinho foi para mim.

Parabéns pelo texto.


Abraços

Patrícia Bueno disse...

Ulisses, os momentos de dor e a sensação de perda nos ajudam a amadurecer, e, em contrapartida, temos que conviver com a dura realidade da saudade. Mas, façamos desta saudade um alento, pois só deixa saudade aquilo que nos fez bem. As lembranças do seu voinho vão ajudá-lo a aliviar a dor. Muito sensível e belo seu comentário. Parabéns.
Fique com Deus!