quinta-feira, 24 de setembro de 2009

A menina no cinema

 Por :Walnize Carvalho



Foi só ela entrar no cinema para que se transformasse.
As cadeiras acolchoadas e aconchegantes (verdadeiro colo) e mais a trilha sonora a transportaram. Abrindo o saco de pipocas – pensou – sem disfarçar o sorriso: - Estou deixando lá fora a pessoa adulta que sou e me encontrando com a “minha” menina.
Quase se imaginou a personagem do filme - a mocinha romântica – “Lisbela e o prisioneiro”.
Mas, não! Haveria de retroceder alguns anos, afinal estava ali para assistir “WALL.E” – um novo gênero de animação voltado também para adultos “em que um simpático robô tem a função de limpar a sujeira deixada na Terra pelos humanos”.
Bem posicionada deixou que os olhos se fixassem na tela. Nem pestanejava. Colocava pipocas na boca com avidez e displicência deixando algumas caírem sobre seu colo.
Aos poucos, embalada pela magia da história, foi se distanciando de si mesma.
Era tempo de férias. Havia crianças e jovens barulhentos à sua volta. Ela não os escutava. Também estava de férias: férias “daquela” que deixou lá fora.
Alguém pediu (pela terceira vez, talvez) licença para passar e sentar-se na mesma fileira.
- Hã!?..., pois não, pode passar! – respondeu de forma automática.
E por minutos se dispersou da cena e pensou “naquela” que ficou do outro lado da sala de projeção.
Suspirou. – Coitada, tão cheia de compromissos, tão cheia de contas a pagar, tão cheia de problemas para solucionar, tão submersa em ocupações e horários, tão... tão.... robotizada!
Em certas ocasiões tão cruel se olhando no espelho e questionando: - Já viu suas rugas na testa? – Reparou nos seus cabelos embranquiçados? – Poxa! Você engordou, heim!? E a mais terrível das provocações: - Não vê que você não é mais uma menina!...
Mexeu-se na poltrona e balbuciou: - Não! Aqui neste momento “ela” não irá me abater.
Tentou ver o filme. Mas de novo cenas legendadas passaram diante do seus olhos: “a outra” até tem certa razão, afinal, ser responsável, cumpridora de suas obrigações não é papel fácil de se representar.
Novamente o pensamento contraditório: mas tanta disciplina todo tempo? Todo dia? Toda vida? Definitivamente, não! – deixou escapar em voz semi-alta.
Afinal, ela precisa fugir um pouco dos compromissos; dar asas à imaginação; ser feliz sem hora marcada e, acima de tudo, eliminar a culpa. Assim, de repente, no meio da tarde estar no cinema desfrutando o direito de ser criança.



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